O Projecto

O projecto Portugal Azulejar tem como objectivo constituir-se como um repositório nacional da azulejaria existente principalmente em contexto de exterior. Se a azulejaria portuguesa presente em espaços interiores, públicos ou privados (igrejas, mosteiros, hospitais, palacetes, etc.), encontra-se amplamente estudada e conhecida, tal não acontece com a mesma dimensão sobre aquela que subsiste no espaço público, ou voltado para ele. Não descuramos a profusão de trabalhos académicos existentes, de cariz essencialmente monográfico. Contudo, o seu conhecimento e visibilidade acaba por se circunscrever ao meio escolar universitário e por isso algo distante do público geral.  

Inspira-nos a personalidade de João Miguel dos Santos Simões, um engenheiro têxtil de formação que acabou por se tornar numa das maiores referências na investigação da azulejaria nacional, tendo desenvolvido um trabalho inovador de inventariação durante o terceiro quartel do século XX. Com o patrocínio da Fundação Calouste Gulbenkian constituiu a denominada «Brigada de Estudos de Azulejaria». O objectivo seria elaborar o Corpus da Azulejaria Portuguesa, obra magnânima inicialmente pensada para cinco volumes e várias monografias, plano esse que viria a sofrer alterações no decorrer do projecto, mas que foi no essencial levada a bom termo. A enorme tarefa tinha a pretensão de fazer um inventário azulejar de todo o território nacional, bem como de exemplares no Brasil. Foram editados os tomos Azulejaria Portuguesa nos Açores e na Madeira (1963), Azulejaria em Portugal nos séculos XV e XVI (1969), Azulejaria em Portugal no século XVII (1971), e Azulejaria em Portugal no século XVIII, este último postumamente em 1979. Santos Simões desenvolveu a sua própria metodologia de trabalho: através de fichas de trabalho por si elaboradas, registavam-se os dados dos painéis inventariados aos quais se juntavam fotografias. Como se pode imaginar, foram produzidas milhares de documentos, uma tarefa hercúlea numa época sem recursos tecnológicos mas que, chegado aos dias de hoje, tal empreendimento é ainda uma fonte de primordial importância para os investigadores.

João Miguel dos Santos Simões. Fotografia do acervo do Museu Nacional do Azulejo.

Diferentes são os tempos quotidianos onde é possível conhecer-se e dar a conhecer qualquer assunto por via de diversas soluções tecnológicas existentes. Nesse sentido, este projecto é aberto a toda a comunidade em geral, podendo para ele contribuir quem assim o desejar, de acordo com regras simples com vista à harmonização de conteúdos. Como se disse inicialmente, este “arquivo” visa abranger a totalidade do território nacional, tarefa impossível para uma única pessoa.

Mas não só de carácter expositivo se reveste esta iniciativa. Importa conhecer as diversas unidades produtivas que se instalaram ao longo do País, desde as carismáticas e centenárias Fábricas (quase todas já inactivas) até às pequenas oficinas, muitas delas com abordagens estéticas próprias acrescentando valor à iconografia. Da mesma forma, os artistas que nelas laboraram – e laboram – e os simples artesãos locais. Ou ainda eventuais aspectos etnográficos e antropológicos próprios de determinadas regiões que se dão a conhecer também por via da pintura em azulejos.

É certo que o Azulejo contemporâneo é de certa forma subvalorizado, pois não se liberta de comparações com a produção dos períodos áureos do passado e que tão bem formaram uma identidade artística nacional única, com dimensão mundial. O desdém começa muitas vezes pelo institucionalismo oficial, ironicamente aquele que deveria ser o primeiro a defendê-lo. Mas no Património, não existem bens de primeira categoria e outros de segunda (ou terceira, quarta…) A riqueza de se tornar conhecido aquilo que se desconhece é a razão para nada se desconsiderar.

O Portugal Azulejar é então, uma obra em constante construção.